20.1.08

13.1.08

Viagens Abreu


Podia ser o irmão janado de Richard Clayderman (Samuel Clayderman). Mas não é. No entanto, se Bjorn Torske trabalhasse para a agência Abreu, estou certo que engendraria um pacote (a propósito, em inglês técnico diz-se bubble butt) chamado: "quando os fiordes transbordaram e, graças ao aquecimento global provocado pelo meu zx spectrum, fizeram subir o nível do mar das Caraíbas". Para arrumar lado a lado com "Jamaica misteriosa" e "Báltico mágico".

7.1.08



Der Heilig Berg, Leni Riefenstahl, 1926

6.1.08

A vida em tempo de guerra



As páginas da Biblia, pedras de sal, botijas de gás, ouro a girar sobre prata, o latido dos cães, uma operação ao nariz. M.C. Schmidt e Drew Daniel, mais conhecidos por Matmos, têm aproveitado tudo isso para compor a sua música. Música concreta, portanto. Mas não só. Aos mais absurdos e disparatados barulhos, juntam o som de intrumentos tradicionais, como banjos, hukeles, tubas, violinos, guitarras, e envolvem a pastarola que daí resulta num fundo de electrónica ao estilo de pioneiros como Raymond Scott ou Louis Barron. The Civil War, editado em 2003, é o meu primeiro grande disco de 2008. Um bloco de música inspirada nas marchas e canções das guerras civis inglesa e americana, onde há lugar para paródia, avant-gardismo, ritmos e cadências entre o marcial e a motwon e, a generosos espaços, para um lirismo arrebatador. Tão arrebatador como só aquele que desperta e submerge da mais bélica cacofonia consegue ser.

31.12.07


Hunter S. Thompson - Sandy and Agar, Big Sur, 1961

30.12.07

2007 em filmes


Cinema e dvd:

Death Proof - Quentin Tarantino
Le Salaire de la Peur - Henri-Georges Clouzot
The Proposition - John Hillcoat
Apocalypto - Mel Gibson
Zodiac - David Fincher

28.12.07

2007 em discos

Cada vez mais compro menos discos no ano em que saem. Prefiro coisas antigas, que me são familiares ou que já passaram o teste do tempo. Por isso, as minhas listas de fim de ano, para não sofrerem de relativismo circunstancial, deveriam ter uma décalage de vários anos. Ou seja, a lista dos melhores discos de 2007 só terá alguma consistência lá para 2017. Para já, olhando para o que ouvi, escolho estes:

Grinderman, Grinderman
Sound of Silver, LCD Soundsystem
Boxer, The National
Pilgrimage, OM
Map of Africa; Map of Africa
West Coast, Studio

Reedições, caixas e afins:

The Complete On The Corner Sessions, Miles Davis (quem nunca ouviu He Loved Him Madly não merece viver)
Movies, Holger Czukay
The Time Has Come, Pentangle
Colossal Youth and Collected Woks, Young Marble Giants

Ah, e Build, dos Housemartins. Prometi e cumpri.

18.12.07

The shape of things to come



Os detractores de Oscar Niemeyer dividem-se em duas categorias: os que, à boleia de ser comunista, atacam a sua arquitectura, e os que por não gostarem da sua arquitectura o xingam por ser comunista. Os primeiros são, digamos que, estúpidos. Os segundos são apenas burros, já que fragilizam um insulto razoável com uma fundamentação de mau gosto. É claro que as obras de Niemeyer têm o seu traço de totalitário. É claro que um mundo desenhado exclusivamente pelo vencedor do prémio “Estaline da paz” seria um mundo insuportável. É claro, pois, que a arquitectura do mestre não é ajustada à normalidade do dia-a-dia. So what. A desproporção liberta. Ao lado dos edifícios de Niemeyer, o homem sente-se diminuído mas livre. Sabe que os seus actos, por comparação, pouca importância hão-de ter. É um estranho numa terra estranha. Um figurante numa história de H. G. Welles ou Robert Heinlein. O humanismo arquitectónico é bom de seguir em casas de banho e cozinhas. No espaço público, na vastidão do Planalto Central, prefiro dimensão e a beleza clássica da simetria. E nisso, o velho Oscar é imbatível.

7.12.07

Gena & John forever (seis meses depois)

A partir de um dado momento - do primeiro, julgo -, o sentimento que mais importa num casamento é o respeito. Mais do que o amor, mais do que o desejo sexual, mais do que a amizade. O respeito, um enorme respeito físico e moral, perante o qual amor, sexo e amizade são meros pressupostos. A Woman Under the Influence (John Cassavettes, 1974), fita sobre o casamento, é uma das grandes lições de respeito matrimonial jamais dada. Não me refiro ao respeito ficcionado e quase mártir que se vê no casamento de Nick e Mebbel. Mas ao respeito real, romântico, bestial, ternurento, orgânico, esbaforido que Cassavettes, a cada fotograma, torna evidente sentir por Gena Rowlands, e que esta, no papel da sua vida (o de mulher), retribui. A busca da felicidade passa por aqui. Felizes daqueles que já encontraram a sua Gena Rowlands.

Le monde diplomatique

Hugo Chavez é alguém que desperta em mim uma imensa nostalgia. Aquela camisa encarnada, a boina e o acentuar pachorrento de certas palavras provocam-me uma enorme saudade. De Nixon, da guerra fria e dos tempos em que a CIA aquietava regimes latino-americanos.

3.12.07

Comédias românticas?

Sim, gosto muito. The Killing of a Chinese Bookie, por exemplo.

27.11.07

Africa minha


Rumble in the jungle, Kinshasa, 1974


The Great CurveRemain in Light, Talking Heads, Roma, 1980

25.11.07


Richard Avedon - Santa Monica, California, 1963

Nite flight

A crónica da Inês Nadais, na última sexta, era sobre brevíssimas biografias feitas a partir de cidades. Dou um exemplo: Lisboa - Joanesburgo - Rio - Madrid - Lisboa, com paragens em pontos dispersos do mapa físico, como Kuala Lumpur, Nova Iorque, Portland ou John O'Groat's, que fica algures no fim do mundo. Ao lê-la, lembrei-me de Soon over Babaluma (Can, 1974), um título violentamente enigmático e sugestivo, que faz pensar em cidades invisíveis, desertos dos Tártaros, montanhas da loucura e voos nocturnos sobre as estepes da Manchúria. E um título que poderia bem descrever o intervalo entre capítulos da brevíssima biografia de um Corto Maltese aviador: Veneza - Ormuz - Badakhshan - Samarcanda - Ulan Bator - e finalmente, para morrer junto aos mares do Sul, Half Moon Bay.

22.11.07

Estou extremamente indignado

Há um estado de alma, muito português, que eu adoro: a extrema indignação. Estar "extremamente indignado" é um dos mais assertivos e nobres gestos de cidadania. Um direito inscrito na estratosfera constitucional, garantem alguns. O bom cidadão é aquele que mantém intacta a capacidade para se indignar de modo extremo. E nós estamos bem servidos de cidadãos exemplares. Todos os dias surgem pessoas extremamente indignadas. Não um pouco, nem muito ou sequer apenas indignadas. Extremamente indignadas, mesmo. Funcionários extremamente indignados com o governo; idosas (somos também um país de velhos) extremamente indignadas com o preço do pão; jovens extremamente indignados com o embaraço da escolha e o rumo do mundo; gente extremamente indignada com as declarações de ... [acrescentar nome de figura pública]. Depois, dentro da extrema indignação, há subgéneros em franca expansão. A indignação com siglas, por exemplo, é um dos que mais tem progredido: jornalistas liberais extremamente indignados com a ERC; gasolineiros de Elvas extremamente indignados com o IVA; Helena Matos extremamente indignada com a ASAE; moradores de Monte Abraão extremamente indignados com a REN; Gerónimo extremamente indignado com a PIDE. Portugal devia organizar anualmente a convenção da indignação, onde, como naqueles encontros de fãs do Star Wars, cada um se apresentaria com a máscara do seu indignado predilecto. Um Chico Louçã aqui, um Fernando Alves acolá, um ex-combatente encostado ao bar, um bombeiro sem meios a fazer xixi no wc. Por cá, até os bêbados vagueiam com uma garrafa na mão e a indignação às costas. Sempre em alta, é uma espécie de lume brando que nos alimenta. É também, paradoxalmente, aquilo que faz de nós uns conformados. Estar extremamente indignado é meio caminho para não fazer nada. Já me indignei, já dei tudo o que tinha a dar. Apareci indignado no telejornal, ganhei créditos para a vida. A indignação é o lexotan do povo, já dizia Oscar Cardozo perante o terceiro anel em fúria. Depois disso só resta carregar a arma e desatar a disparar, como se não houvesse amanhã e fosse este um país desenvolvido. Graças a Deus, ainda não é, e ninguém chega a dar esse passo. Lembro-me de uma novela onde Joel Branco se mostrava extremamente indignado com a gerência de um bar chamado "Catacumbas". Ora, um país onde alguém se indigna com a gerência de um bar chamado "Catacumbas" é um país saudável para criar os filhos. Extremamente indignado, mas feliz.

15.11.07

Da formosura

As Gordas, tomai nota, são as mais generosas, pois não sabem onde nem quando surgirá a próxima oportunidade. A vingança aqui, a haver, serve-se sob a forma de sofreguidão.

Bourbon safari


Também eu tenho um encómiozinho para a família real espanhola e seus afins. Desta vez, para não cansar, na pessoa de Jaime de Marichalar. Além das gravatas - sempre impecáveis - e dos traços de coca, importa assinalar o facto de, há uns anos, durante uma gala de beneficência em Nova Iorque, ter xingado dois artistas cubanos que não criticaram de modo assaz veemente Fidel Castro e o seu domínio selvagem sobre a ilha. Consta que Don Jaime, que nunca na sua vida errática foi sujeito a sufrágio, acabou por abandonar a sala nos braços de Bianca Jagger, enquanto chamava o dinossauro de "asesino" e "maricón". Temos genro.

10.11.07

tough guys don't dance


Os duros não dançam. Nem usam diminutivos nos adjectivos. Nem comem duchesses. Mas os duros também morrem. Hoje foi a vez de Norman Mailer.

Mais Grannis

9.11.07

Nota sobre o dia 8 de Novembro de 2007

Na hora h, enquanto olhava para dentro do bloco operatório através do óculo e dos óculos embaciados pelo calor do bafo a esbarrar na máscara asséptica que me cobria a boca, lembrei-me de David Bowie, de Space Oditty, e daquele momento em que a música pára e se ouve, em simultâneo com o final da contagem decrescente, ... Check ignition and may God's love be with you. Julgo que é isso mesmo: que Deus esteja sempre contigo nesta viagem.

2.11.07

Astral Weeks


Cometas como Hans-Peter Lindstrøm, que aparecem de dez em dez anos, costumam deixar lastro. Enfia-se a cabeça no baú do Italo Disco, uma espécie de pornochanchada da música pop, mas em bom, certifica-se o objecto como um tributo a David Mancuso, e cá vamos nós. Viagem garantida.

28.10.07

Conde Redondo Feliz - d'après Cem Anos de Solidão

«Setenta e um anos, três meses e dezassete dias depois, diante de uma imperial e um pratinho de tremoços, o velho praça Rolando Bonifácio Mealha havia de recordar aquela tarde remota em que o seu pai o levou às putas da Luciano Cordeiro.»
(Anónimo)


The Road

Não sei se foi essa a intenção, mas a ideia que mais me tem ocorrido durante a leitura de The Shape of Things to Come, o último livro de Greil Marcus, é a ideia de "estrada" como um daqueles elementos essenciais de que é feita a argamassa que une a cultura americana. A América, que começa por ser um país assente em proclamações, declarações e discursos, regressa sempre, de uma maneira ou de outra, à estrada - ou, num sentido mais naturalista, ao caminho. Marcus fala dos inadaptados: da personagem de Henry Fonda em As Vinhas da Ira; de Jack Bauer, suposto morto, a caminhar com a mochila às costas no final de uma das séries de 24, qual John Wayne pós-11 de Setembro; do homem descrito por John dos Passos no início de U.S.A.: "no job, no woman, no house, no city". E mais à frente fala também de Lost Highway, da última cena, com Bill Pulman estrada fora, a alta velocidade, como se todos os medos do mundo o perseguissem. E perde-se a descrever com detalhe o traço descontínuo da auto-estrada e o que este quererá significar. E podia ainda falar do On the Road, de Kerouac. Ou de On the Road Again, um outro sinónimo para a "república invisivel". Ou em The Road, de Cormac McCarthy, onde a estrada é uma vez mais a casa dos que não têm casa. Nos grandes países, a geografia é determinante. E nela entram a estrada, o caminho, os infindáveis caminhos que acabam sempre por bifurcar e se cruzar, as encruzilhadas onde o destino hesita e se decide.




Pipeline (No. 54), 1973

Palos Verdes Cove, February 22, 1964

O surf é um desporto, mas é também uma cultura dentro da cultura americana. E LeRoy Grannis é o seu Walker Evans. Sem querer ser desconstrutivista, algumas das fotografias que tirou no período de ouro dos anos 60 e 70 merecem o melhor dos museus de arte moderna. Aqui, mais do que a estética (sublime), é o escapismo quem mais ordena.

23.10.07


Como bem lembrou um amigo: não há conversa de engate mais infalível que a que versa sobre os livros de Julian Cope. Depois de Krautrocksampler, temos Japrocksampler. Aconselhável com asiáticas, gémeas polacas, tulipas e chaminés.

21.10.07

16.10.07

Do vídeo amadorismo:

Reparo que naqueles irritantes filmes de retrospectiva de vida, que agora nos impingem em festas de anos e outras, os ex-maridos e as ex-mulheres são literalmente apagados. Quem diria que, com "o fim da História", o camarada José Estaline iria acabar como uma incontornável referência do biopic artesanal.

15.10.07

Amabutho hoofsaaklik

Não há nada mais distante do Apartheid (a começar pelo próprio Estado Sul Africano, só que agora ao contrário, com o tolerado slogan "Kill the Boer, kill the farmer") que os actuais Springboks. Lado a lado com Brian Habana e J P Pieterson competem vários membros da família Botha, os irmãos Jannie e Bismark (sic) du Plessis, e gente com nomes como Johannes Muller, Andre Pretorius, Os du Randt, Schalk Burger ou Christoffel Johannes van der Linde.

Patriotic music

"I remember that the music in Deep Throat was campy and adorable. Porn films always had that boom-chicka-boom-chicka-boom music, bur Gerard Damiano (the director) always had the desire to go straight, so he put in music that was unlike typical porn music. Not just bouncy stuff, but more fun-goofy-crazy music. There's the scene where the guy orgasms in Linda's mouth. Rockets and explotions are blasting off, and they play all this patriotic music."

Ron Jeremy nas liner notes do LP Deep Throat I.

12.10.07

We're a happy family


Betty Davis e Miles ficam lindos lado a lado.

10.10.07

Lonesome and long bear club band


Nem que fosse pelo prazer da barba, valeria a pena formar um super-grupo de que fizessem parte Devandra Banhart, Kawabata Makoto (o guru do Acid Mother Temple), Will Oldham circa Master and Everyone, e o bom e velho marxista Robert Wyatt.

Um blog chabalista

Congresso do PSD - da série: expressões gatilho

Ou, intróitos para uma standing ovation

“... uma entusiasmante resposta das bases!”
“... dar a cara em tempos difíceis”
“... renascer a partir do poder local”
“... ao contrário de muitos intelectuais de salão”
“... a herança de Francisco Sá Carneiro”
“... Sá Carneiro”

Cinema chungamental

O cinema chunga (trash, exploitation, etc.) é o quarto de brinquedos dos cinéfilos. Tirando alguns académicos mais sisudos, todos acabam por lá se sentar de cócoras.

Deus, barbas, famílias

Um dos aspectos mais simpáticos e saudáveis do conservadorismo tradicional é a persistência no uso das palavras segundo o seu sentido comum. Por exemplo, Deus é Deus - uma Entidade, por vezes retratada com uma barba branca, em que se crê ou não crê. Não é a classe operária, nem o Estado, nem “o mercado”, nem um guerrilheiro latino-americano, nem aquela outra entidade, também barbuda, que em tempos escreveu um livro sobre a forma das coisas que haveriam de vir.

Love at first sight

O primeiro impacto é o impacto visual. Um homem vê uma mulher linda de morrer e logo a classifica, numa escala de um a dez, com a nota máxima em fisico-química sentimental. Depois, com sorte, vêm os gestos, as conversas, os encostos, outros olhares, outros impactos. Só que estes, na melhor das hipóteses, apenas lhe poderão garantir a manutenção da nota obtida.

Stranger than Paradise

Dois anos depois de Swordfishtrombones, o álbum (será “álbum”, para além de um arcaísmo, uma expressão a abater?) que marcou o início da fase pós-Hopper, Tom Waits gravou Rain Dogs. É o arquétipo do disco de “ilha deserta”. Extenso e multifacetado; capaz de suscitar reacções e sensações que vão do medo à euforia, da coolness à nostalgia e à vontade de chorar; com melodias insólitas, instrumentação desconcertante e, pelo menos, seis ou sete músicas do cânone Ocidental. Uma delas é este Jockey full of Burbon. Jim Jarmusch, patrono da casa, concorda comigo.